sábado, 22 de outubro de 2011

Abusado - O Dono do Morro Dona Marta

Nunca pensei que poderia ler algum livro-reportagem tão bom quanto A Sangue Frio de Truman Capote. O estilo de Caco Barcellos e do escritor americano assemelham-se na maneira de escrever o new journalism, ou jornalismo literário. Capote faz Hickock e Smith (os bandidos assassinos) seduzirem os leitores pela sensibilidade da dupla. Contraditório e ao mesmo tempo brilhante, Caco Barcellos faz o mesmo com Marcinho VP (ou Juliano VP como ele chama no livro).
                                                                                                   
Um bandido que gostava de ler, preocupava-se com o bem estar do amigos mais do que com o seu próprio, não roubava para ele, mas sim para toda uma comunidade que precisava. Marcinho VP gostava de ser chamado de guerreiro porque já tinha sobrevivido a tiros de revólver e fuzil, a dezenas de tiroteios, a rebeliões, a fugas da cadeia, a perseguições nas ruas. Ele foi criado no meio tráfico e tornou-se chefe de uma das maiores favelas do Brasil: do morro Santa Marta. Fazia parte do Comando Vermelho, o CV, que na década de 90 foi uma das organizações criminosas mais poderosas do Rio de Janeiro. No final, acabou sendo morto pelos próprios companheiros dentro da cadeia.
Caco Barcellos consegue colocar o leitor dentro de uma das favelas mais populosas do Brasil, faz entender o que é viver sob constante mira dos bandidos e policiais, e no final das contas, ser traído por quem um dia, Marcinho passou o comando do Santa Marta. Foragido em Buenos Aires, estudou espanhol e filosofia. Interessava-se por temas sócio-políticos e achava que poderia tirar a sua comunidade da miséria. ''O lado certo da vida errada'' era como Marcinho definia sua existência.
Mesmo com a possibilidade de morar em Paris com tudo pago pelo pai de uma publicitária rica com a qual se envolveu, ele recusou alegando que o pessoal do morro precisava dele. Um traficante que não usava as drogas pesadas, somente a maconha, não bebia e não deixava ninguém na mão, revela um lado dos bandidos que muita gente não enxerga. Claro que nem todos são como ele. Como o assassino Carlos da Praça e tantos outros que fazem atrocidades com inocentes. 
O escritor foi muito criticado pela mídia e pela polícia por ter ''compactuado com o tráfico e a violência''. Na verdade, o que Caco Barcellos fez foi conversar com o Marcinho sobre a vida dele no morro Santa Tereza. Ele não deixou em nenhum momento, sob hipótese alguma, que o criminoso revelasse algum plano de assalto ou fugas futuras. Não queria ser testemunha de um crime e ficar omisso. 
Com medo de ser capturado pela polícia, o protagonista encontrava-se com o jornalista em muquifos e lugares muito escondidos. Caco Barcellos mais uma vez mostra porque é um dos melhores repórteres investigativos do país e nos ajuda a entender o submundo da realidade do tráfico de drogas carioca. 


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