domingo, 25 de março de 2012

Perda total

Quando vou viajar e chego mais cedo no aeroporto, fico na sala de embarque observando as pessoas e pensando o que vão fazer, como é a vida delas e principalmente, se alguém as estão esperando. É quase como uma terapia.  O curioso é que sempre imagino o lado bom da situação. Alguém que está viajando a trabalho e vai ver a família no fim do dia, a namorada que vai visitar seu amor que mora longe, o recém-formado que vai para uma entrevista de emprego.. É impossível saber disso tudo simplesmente olhando para as pessoas. Foi exatamente nesses detalhes do cotidiano de alguns passageiros não tão sortudos quanto os que idealizo, que o escritor Ivan Sant`Anna explorou ao máximo, no livro Perda Total
 
Os três maiores acidentes da aviação brasileira são minuciosamente explicados pelo autor que é um especialista no assunto. A primeira parte é sobre o voo 402 que saindo de Congonhas permaneceu no ar por apenas 24 segundos, já que partiu com o reverso (serve para auxiliar na desaceleração da aeronave) virado. Ou seja, ao invés de decolar o avião caiu sobre o bairro Japaquara em São Paulo. No total, 99 vítimas fatais. O comandante da tripulação, José Antônio Moreno, piloto experiente da TAM, saiu de casa no dia 31 de outubro de 1996 para fazer a ponte aérea SP-Rio. Sem nem ter ideia de que nunca chegaria no destino final. Ele dizia para sua esposa que se morresse no ar, iria morrer feliz. Seu pedido, infelizmente cedo demais, foi atendido. 
Dez anos depois, o improvável aconteceu. Duas aeronaves colidiram no ar.  Um Boeing da Gol e um Legacy de uma empresa privada. Mesmo com toda a tecnologia de controle dos voos, não foi possível evitar a negligência dos pilotos do jato comercial. Sem querer, um deles desligou a tecla TA/RA (Traffic Adivisory/Resolution Advisory) que avisa quando algum avião está por perto e permite liberar sua localização para outras aeronaves. Ao invés disso, a tecla estava em Stand-by (espera).  Os sete ocupantes do legacy conseguiram pousar, mas os do Boeing 737 não tiveram tanta sorte. 150 vidas foram tiradas no desastre. O Legacy partiu de São José dos Campos e seguiu viagem para os Estados Unidos. Os pilotos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino só tiveram a asa de sua aeronave danificada, enquanto a maior aeronave perdeu o controle e caiu no meio da floresta Amazônica. Lepore e Paladino podem ser considerados os culpados pelo acidente, mas a responsabilidade dos controladores de voo brasileiros não foi menor. Há provas de que os pilotos tentaram pelo menos 15 vezes contato com a central de aviação brasileira, mas ninguém retornou. 
Alguns meses depois, a maior tragédia da aviação brasileira estava por vir. O voo 3054 da TAM que saiu de Porto Alegre em direção à Congonhas estava com um problema no reverso (de novo). Segundo as normas da aviação brasileira, toda aeronave pode voar até 10 dias com esse defeito e depois ele deve ser consertado. O voo 3054 estava há quatro dias com o defeito. A condição da aeronave era problemática ainda mais se pousasse em uma pista molhada. Nesse dia 17 de julho de 2006 chovia muito em São Paulo. O avião não conseguiu atrito suficiente para pousar, e o defeito no reverso contribuiu para que 199 pessoas morressem naquela noite. Fora os passageiros, alguns funcionários da TAM Express que fica na frente do aeroporto de Congonhas estavam no lugar errado, na hora errada. Alguns valentes, como o gerente de cargas da TAM, José Antonio Rodrigues Santos da Silva que não foi atingido diretamente pelo avião, mas permaneceu no local para salvar a vida dos colegas de trabalho. Alguns dias depois, foi noticiada a morte do gerente por infecção pulmonar causada pela fumaça tóxica da explosão. 
Vidas de pessoas comuns que só iam passar um dia em outra cidade, iam visitar a esposa ou o marido, ou participar de alguma reunião importante acabaram tragicamente por falhas humanas.Tristes episódios que marcaram o Brasil e a vida de familiares daqueles que desejavam simplesmente voltar pra casa.

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